Com a aproximação das eleições, é normal que as pessoas falem mais sobre suas opiniões políticas no dia a dia, inclusive no ambiente de trabalho — comentar debates que tenham acontecido, entrevistas ou até mesmo aparições públicas dos candidatos. Mas falar sobre o assunto no ambiente profissional pode ser motivo para demissão?
O advogado Renato Canizares, sócio da área trabalhista do escritório Demarest, diz que a lei não permite que uma empresa demita um funcionário por opiniões políticas e que isso é considerado discriminação — porque fere o direito à liberdade de expressão garantido pela Constituição Federal.
A grande dificuldade é comprovar que a demissão foi motivada por questões políticas, já que as empresas não costumam dizer ao funcionário que este é o motivo da dispensa.
Paulo Sardinha, presidente da ABRH Brasil (Associação Brasileira de Recursos Humanos), afirma que a discussão política é um exercício para a cidadania e, por isso, não deveria ser motivo para demissão. Para ele, nada que é feito com equilíbrio costuma comprometer o emprego do profissional.
O que fazer se for demitido por opinião política? Ursula Cohim Mauro, advogada trabalhista e sócia do escritório Orizzo Marques Advogados, diz que quem é demitido por opinião política pode entrar na Justiça para receber uma indenização e até para voltar ao emprego antigo, se quiser.
A orientação dos especialistas ouvidos pelo UOL é buscar a ajuda de um advogado para entender o que dá para ser feito em cada caso.
O que serve como prova na Justiça? Não existe uma receita de bolo, segundo os advogados.
Cada caso é avaliado pelo juiz e depende das provas que a pessoa conseguir mostrar à Justiça.
Os advogados dizem que documentos, conversas gravadas, prints ou testemunhas podem servir como provas. Se a discriminação for comprovada, a pessoa pode receber indenização por danos morais.
Em que situações a demissão por política pode acontecer? Se a opinião política da pessoa estiver interferindo no trabalho ou no dia a dia do profissional. Sardinha diz que alguns exemplos são se o profissional exagerar no assunto, adotar um discurso de ódio ou tentar convencer os colegas em que candidato votar, por exemplo.
A questão é que neste caso a pessoa não seria demitida pelas suas opiniões, mas sim porque suas atitudes estão atrapalhando o dia a dia profissional. Neste caso poderia até caber demissão por justa causa.
Para ser demitido por justa causa, o profissional precisa descumprir alguma das regras previstas na CLT, como ser indisciplinado no trabalho, agir de má-fé ou cometer roubos e furtos.
Já a demissão sem justa causa, como o próprio nome diz, não precisa de um motivo. A diferença é que a demissão sem justa causa tem alguns pagamentos indenizatórios a mais do que com justa causa. Apesar de a demissão ser uma possibilidade, ela é a medida mais extrema que uma empresa pode adotar. Canizares diz que a pessoa que está causando problemas pode levar uma advertência da empresa em um primeiro momento e que a demissão seria a solução caso conversas anteriores não tenham funcionado.
Posso falar de política nas redes sociais? Sim, mas Canizares diz que a empresa pode pedir para que o funcionário não vincule o nome da companhia nos posts. Cada um pode falar o que quiser, desde que não vincule a opinião individual à empresa, diz Canizares.
Política em processos seletivos
Sardinha diz que perguntar a opinião política não é pertinente nos processos seletivos, porque não tem ligação com o desempenho da função. As perguntas feitas durante os processos seletivos devem ser para avaliar as capacidades do profissional de exercer a vaga para qual ele está se candidatando.
E se a opinião interferir no trabalho? Neste caso, a pergunta pode ser feita, mas só em situações muito específicas. Mauro diz que isso pode ser relevante a um profissional que vá trabalhar na campanha de algum candidato, por exemplo.
Segundo ela, perguntas sobre a vida particular do profissional —como opinião política, orientação sexual ou religião — não deveriam ser feitas em nenhum processo seletivo. Os recrutadores devem sempre focar nas perguntas que vão determinar as habilidades do trabalhador para exercer o cargo, caso seja aprovado.
A advogada afirma que as perguntas pessoais só devem ser feitas se tiverem alguma relação com o futuro desempenho da pessoa na vaga. A pessoa pode entrar com um processo na Justiça contra a empresa caso participe de um processo seletivo e se sinta discriminada de alguma forma.
FONTE: UOL